quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Trocando ideias com o amigo Philippe Guedon...

Reproduzo artigo (de 2007) deste incansável Solidarista da minha cidade natal que foi recentemente agraciado com a "Medalha Koeler" - maior honraria concedida pelo município de Petrópolis, RJ - e que muito colaborou para meu gosto por Política e defesa da Cidadania...


Reflexão Comunitária


A maior virtude das democracias é a alternância dos governos eleitos pelo voto livre dos cidadãos. Mas é, também, o seu calcanhar-de-aquiles. Nenhuma empresa alcançaria êxito, e sequer a sua sobrevivência se, a cada quatro anos, tivesse de mudar de presidente, diretores, conselheiros de administração e fiscais, e boa parte de suas gerências e chefias intermediárias. Os acionistas de nossa sociedade imaginária rapidamente se conscientizariam que a sucessão de gestores acarreta como corolário seguidas alterações de visões, objetivos, organizações, métodos, programas, prioridades, políticas, em suma de todo o perfil da companhia. O insucesso seria previsível. Pois dessa maneira funcionam os municípios (âmbito sobre o qual nos detemos aqui). A cada quatro anos, escolhemos novos prefeitos e vice-prefeitos. No máximo e por enquanto, uma reeleição assegura quatro anos adicionais ao principal mandatário, o Chefe do Executivo. Os efeitos dos câmbios freqüentes ficarão represados, para retornarem logo adiante. Sai um prefeito, outro/a assume o lugar; no mesmo dia, tomam posse novos vereadores na Câmara, e o prefeito nomeia um Secretariado composto segundo os seus critérios pessoais. Dada a nossa cultura de criação e reserva de número excessivo de CCs - os cargos de confiança - não só as cúpulas são objeto de mudança, mas a maior parte dos gestores dos escalões médios. Os Servidores que dedicam sua carreira à Administração Pública ao longo de cerca de três décadas e meia, convivem com nove, ou até mais, diferentes Prefeitos, e adaptam-se à outras tantas filosofias; os que já percorreram boa parte da estrada, sabem avaliar as danosas conseqüências da falta de continuide Os enfoques diferentes que adotam mandatários e população costumam ser ignorados por quem deveria impedir a sua ocorrência: políticos, partidos, imprensa, sociólogos, lideranças comunitárias. Pois que caiba ao nosso minúsculo PHS bradar, respeitosamente, que, ou se encontra solução para essa discrepância, ou não avançaremos, de fato, nos campos da participação, da continuidade, do planejamento. Os discursos a respeito permanecerão inócua expressão de intenção generosa, condenada a ficar por isso mesmo. Boa parte das competências da vida administrativa municipal traduz-se - ou deveria traduzir-se - por políticas de médio e longo prazo. Educação, formação profissional, saneamento básico, saúde, transportes públicos, desenvolvimento econômico, meio ambiente, ciência e tecnologia, habitação popular, administração pública, urbanismo, preservação, e outras vertentes importantes do que chamamos "governo municipal" requerem a prévia definição de metas, assim como dos prazos e da viabilização financeira da caminhada Essa prévia definição dos rumos e dos propósitos implica em planejamento que ilumine, pelo menos, os oito ou dez anos à frente. O que é incompatível com o encolhimento de nosso horizonte para respeitar os mandatos quadrienais. O sistema orçamentário repousa sobre três leis: o plano plurianual (4 anos), do qual derivam sucessivas leis de diretrizes orçamentárias (LDO) e leis orçamentárias anuais (LOA), estabelecidas antes de cada exercício. Aos planos diretores, previstos pela Constituição Federal e retomados pelo Estatuto das Cidades (Lei Federal 10.257/01) não foram impostos prazos definidos; o Estatuto só considerou caduco o plano diretor que não tivesse sido revisto após decorridos dez anos de sua adoção. Em outras palavras: sabemos que grande parte das políticas que integram as competências municipais exige prazos dilatados para a sua correta implementação, mas aceitamos um sistema que limita o nosso horizonte aos próximos quatro anos. Temos consciência que esse procedimento equivale a incentivar o improviso e impede uma ação que otimize os sempre insuficientes recursos de que podemos dispor. Mas não reagimos contra esse estado de coisas.


Aos petropolitanos, deveria ofender terem visto um matadouro tornar-se sacolão, depois teatro, a seguir secretaria, e então escola. Cinco usos sucessivos em poucos anos, um bocado de dinheiro inutilmente gasto por falta de planejamento e de consistência. Mero exemplo, colhido em seara fértil. Nem fechando os olhos bem apertados, escaparemos à evidência: os governos detêm o poder de fazer (Executivo) e de legislar e controlar (Legislativo). A eles é confiado o comando da nau por quatro anos. Mas só por quatro anos. E o que excede esses quatro anos? A resposta só pode ser no sentido de afirmar que a população não delegou poderes para ninguém além dos quatro anos do mandato. Cabe às comunidades perceber que elas detêm o que falta aos governos, porque a Constituição assim o requer: a perenidade. A partir as comunidades, somente delas, de ninguém mais além delas, poderão surgir as condições para que ocorra planejamento de médio e longo prazo no município. A democracia participativa inscreve-se, assim, ao lado da democracia representativa, de maneira harmônica e eficaz.


Nada inventamos aqui. Está lá escrito na Constituição de 88, logo no parágrafo único do artigo 1º: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição". Os poderes que não foram outorgados, continuam nas mãos do povo. Balizar o médio e o longo prazo é tarefa que a ninguém foi delegada, e somente a ativa presença do povo na formulação e acompanhamento do planejamento que lhe convém, assegurará a indispensável continuidade. Por sua vez, a continuidade é perspectiva cara aos bons prefeitos e vereadores, que temem ver o que de bom fizeram desaparecer de um dia para outro, sem que possam impedi-lo. As comunidades e os bons administradores concordarão que o planejamento é condição sine qua non para que ocorra a prática da verdadeira participação. Exemplificamos, para clareza. Cenário 1: o planejamento prevê que, em determinado período de governo, serão pavimentados 10 quilômetros de "logradouros". Ao fim do período, será possível avaliar: foram pavimentados os 10 kms, meta cumprida, bacana. Pavimentaram-se 11, foi superada a expectativa, vamos ver como se deu o feito e, se for o caso, vamos aplaudir. Se não se ultrapassou a casa dos 9, vamos ver o que aconteceu, para formar juízo a respeito. Ou seja: as condições necessárias e suficientes para a participação estão presentes: planejou-se uma meta, e estuda-se o verificado em relação ao previsto. Cenário 2: o candidato faz boca de siri, não se compromete com nada e leva os eleitores no papo. Ao fim de seu mandato, pavimentou escassos dois quilômetros. Mas pode adjetivar a sua modesta obra como um feito retumbante, o maior desde Tomé de Souza (muito lembrado ultimamente). A diferença entre os dois cenários é abissal, em termos de boa gestão de um município, de forma sustentada, continuada, consistente. Acrescentamos uma reflexão de cunho ético: em que medida um governante cujo mandato tem o limite de quatro anos, tem o direito de conceber e de implementar políticas públicas cujos efeitos ultrapassam tal período, sem recorrer ao respaldo específico da vontade popular? Imaginemos uma situação concreta: o Chefe do Executivo elabora, com os seus auxiliares da área em pauta, uma política de saneamento básico, que pressupõe uma oncessão dos serviços de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgotos ao longo dos próximos trinta anos. Terão o Prefeito e os Vereadores, eleitos para mandatos de quatro anos, o direito moral de definir um aspecto relevante da vida municipal que vai abarcar, pelo menos, vinte e seis anos além do mandato que lhes foi outorgado, sem recurso a um plebiscito específico, à ciclos de audiências públicas, a amplos debates no seio de conselhos legitimados pela população? Participamos intensamente, em Petrópolis/RJ e desde o início da década de oitenta do século passado, dessa atividade conhecida por "participação popular". Já lá se vai, pois, mais do que um quarto de século. Temos a crescente convicção que a resposta ao desafio que esboçamos até aqui reside no delicado equilíbrio entre o poder/dever da ação governamental e a contínua participação comunitária. Se souberem completar-se, o céu é o limite; se duelarem pela hegemonia, irão anular-se reciprocamente em maior ou menor grau. E cometerão incomensurável burrice, pois governo e comunidades organizadas emanam do mesmo povo e são complementares. Voltemos à nossa comparação entre um município e uma empresa. A população do primeiro pode ser assimilada aos acionistas da segunda; os prefeitos e os presidentes são eleitos pela população e pelos acionistas, respectivamente; Da mesma forma, e pelos mesmos universos, são eleitos os vereadores, de um lado, e os conselheiros (fiscais ou de administração) de outro. Entendemos que as diferenças se fazem presentes a partir deste ponto. Olhemos, primeiro, para a empresa: eleito o presidente, constituída a sua diretoria, formados os conselhos, continua a assembléia geral dos acionistas a enfeixar poderes (de exigência de informação, de participação, de avaliação e de controle) que se manifestam a qualquer momento, ao longo dos mandatos concedidos. Por exemplo e com particular destaque, a cada ano devem os administradores da sociedade comparecer diante das AGOs dos seus acionistas (comparando: diante de toda a população) para prestar contas do exercício findo e propor programas para o vindouro, submetendo-se ao referendo de quem lhes outorgou o mandato. E, sempre que for conveniente, uma AGE será chamada. Já, a nível da administração pública, o diálogo população/poder público adota o ritmo quadrienal. Entre duas eleições, salvo uma ou outra ainda rara proposta de democracia participativa, o processo decisório costuma ficar restrito aos poderes Executivo e Legislativo entre si (ao que corresponderia a um diálogo empresarial reservado entre a diretoria executiva e seus conselhos, sem intervenção da assembléia geral dos acionistas). Não se facilita o acesso da população ao processo decisório, e vê-se a participação como uma renúncia das autoridades eleitas à uma parcela do poder inerente aos seus mandatos. Os poderes permanentes e amplos das assembléias gerais não encontram, em verdade, paralelo na vida pública. Os efeitos de sua ausência são, sob o ponto de vista da participação, devastadores.


Há que serem criados instrumentos correspondentes às AGOs e AGEs das sociedades anônimas para que a nossa democracia funcione plenamente. Se ambicionarmos levar para a dministração Pública os padrões de eficiência e de controle social vigentes na iniciativa privada, este é o ponto que deve merecer a nossa atenção, nossas reflexões e nossas providências.


Existem administrações públicas que aceitam (e até há aquelas que estimulam, por duas vezes tivemos o privilégio de viver tais processos) o diálogo permanente com as comunidades; existem municípios onde a imprensa é atuante e independente, eqüidistante entre a situação e à oposição; existem comarcas onde o Ministério Público se mostra atento e consciente de seu papel de Fiscal da Lei e defensor da cidadania. Mas existe, claro e infelizmente, uma considerável maioria de lugares e momentos onde os eleitores, paparicados quando das campanhas, são vistos como inconvenientes entre janeiro do ano Um e julho do ano Quatro. Épocas, simples coincidência, do início dos mandatos e das campanhas eleitorais subseq6uentes... Gostaríamos, aqui, de sugerir um esquema que nos ajude a transmitir uma proposta de convivência mutuamente respeitosa


e fértil entre um governo municipal e a comunidade organizada local.Quem sabe poderá ser útil a alguém que esteja percorrendo essa mesma trilha?


Anexamos uma representação gráfica dessa maneira de ver a interface permanente comunidade/governo, e passamos a explicá-la:






POPULAÇÃO






GOVERNO COMUNIDADES


ORGANIZADAS






EXECUTIVO (sem contrapartida)






PREFEITO (sem contrapartida)


SITUAÇÃO CONVIVÊNCIA OBRIGATÓRIA SITUAÇÃO/OPOSIÇÃO






SECRETARIADO FÓRUM POPULAR /


CÂMARA DE ENTIDADES


(ou arquipélago estéril de


entidades)






CONSELHOS






AUDIÊNCIAS PÚBLICAS






PLEBISCITO/


REFERENDO










LEGISLATIVO FÓRUM POPULAR /


SITUAÇÃO/OPOSIÇÃO CÂMARA DE ENTIDADES


CONVIVÊNCIA


SITUAÇÃO / OPOSIÇÃO


(CONTRADITÓRIO (ou arquipélago estéril de


ESTIMULADO) entidades)






TRIBUNA LIVRE






EMENDAS POPULARES






AUDIÊNCIAS PÚBLICAS






OUVIDORIA DO POVO










GOVERNO (administração pública, se preferirem) e COMUNIDADE ORGANIZADA têm a mesma origem: ambos deitam raízes na POPULAÇÃO, composta por todos os moradores de nosso município. Assim, fica claro o equívoco de quem enxerga confronto entre um e outra, pois ambos têm a mesma raiz, são as duas mãos de um mesmo corpo. É tão absurdo GOVERNO e COMUNIDADE ORGANIZADA se estranharem, tratarem-se mutuamente como adversários, quanto a mão direita socar a esquerda ou esta beliscar aquela. Pouco importa se o desentendimento tiver sido iniciativa do governo ou das


comunidades organizadas, como tanto faz se a iniciativa do soco ou do beliscão for da mão esquerda ou da direita. A nossa representação gráfica ostenta, no alto, a palavra POPULAÇÃO, soberana e bem equilibrada no meio da página. Logo abaixo, e até o pé da folha podemos traçar uma linha que crie dois campos complementares e harmônicos, as duas faces da mesma moeda. A linha não ergue barreira; ela só existe para nos permitir entender o fértil intercâmbio.


Como referencial e para melhor compreensão, evoquemos aos três poderes, harmônicos e independentes entre si, que prevê a Constituição: Executivo, Legislativo e Judiciário. Cada qual é uma parte de um todo. Nenhum pode subsistir por si só, e nenhum é "mais" ou "menos" do que os dois outros. A POPULAÇÃO do município necessita de um GOVERNO que atue como A DIRETORIA EXECUTIVA e como os CONSELHOS de uma empresa. Eleitora do GOVERNO, composto por EXECUTIVO e LEGISLATIVO, a POPULAÇÃO não precisa de qualquer forma de organização correspondente, na sua vertente COMUNIDADE ORGANIZADA.


Escreveremos abaixo, do lado GOVERNO, a palavra EXECUTIVO e, logo abaixo, PREFEITO. Impõe-se uma meia-trava para que os conceitos fiquem bem claros.


Os Poderes Municipais são dois, já que o Judiciário, de organização estadual, distribui-se no território através de comarcas que não correspondem, necessariamente, aos limites municipais. Temos o EXECUTIVO municipal, como temos o LEGISLATIVO municipal, ponto e só. Vamos deixar este para um segundo tempo, e examinar aquele. Quando das eleições municipais, escolhemos o nosso futuro Prefeito, para chefiar o Poder Executivo ao longo dos próximos quatro anos. Os candidatos são apresentados por partidos, como manda nosso quadro legal (nem ONGs, nem Sindicatos, nem OSCIP nem qualquer outra forma de associativismo podem indicar candidatos, ao revés de outros países, que acolhem a figura do


candidato independente); aqueles partidos e aqueles cidadãos que apoiaram o eleito irão transformar-se em situação, e os que defenderam os derrotados formarão a oposição. Ocorrerão transferências de cá para lá e vice versa, mas elas não mudarão a obrigatória existência, desejável e salutar, de uma situação e de uma oposição. Nunca esqueçamos que a democracia pressupõe que esses rótulos sejam trocados de temos em tempos.


Ninguém É situação ou É oposição. ESTÁ num, para ESTAR noutro a seguir, e fica nessa situação pendular ao longo de sua vida. A coexistência entre situação e oposição, entre os que apóiam e os que adotam postura crítica, assume três formas diversas, conforme enfocamos o EXECUTIVO, o LEGISLATIVO e a COMUNIDADE ORGANIZADA. O EXECUTIVO é a casa da situação; por definição, a oposição fica de fora. Se a oposição quiser participar do EXECUTIVO, ela deixa, no mesmo instante, de ser oposição e vira base da situação. Já, no LEGISLATIVO, situação e oposição devem compartilhar o espaço, defendendo posições divergentes, em ambiente de mútuo respeito. A Câmara Municipal é o espaço adequado para que ocorra o permanente contraditório situação/oposição, em função da postura decidida por cada partido, e da evolução de sua vida interna. Este mesmo contraditório, inexistente no seio do EXECUTIVO, indispensável no LEGISLATIVO, e normal na vida político-partidária, não pode nem deve invadir a vida associativa comunitária. Pois o que é saudável no ramo GOVERNO, adequando-se às características próprias do EXECUTIVO e do LEGISLATIVO, revela-se peçh Podemos insistir neste ponto? Quando se fala de médio ou longo prazo, a visão situação / oposição é outra.


Nos próximos doze anos (por exemplo), conheceremos três governos. O oposicionista de hoje será o situacionista de amanhã, e nem desconfiamos o que na terceira rodada. Ou seja, se não arrancarmos esse limitador de abrangência de nosso convívio no seio da COMUNIDADE ORGANIZADA, não vamos a lugar nenhum, por aceitar vício de forma liminar. As divisões que estimulam o processo político (e geram as "partes" ou partidos), quando ocorrem do lado do GOVERNO, nada mais


fazem do que debilitar a ação comum, quando invadem o lado da COMUNIDADE ORGANIZADA. Esta só viceja lá onde as pessoas sabem conviver, umas com todas as outras, sem exclusões, aportando as suas singularidades em dote para a constituição do amplo balaio da riqueza geral. Na COMUNIDADE ORGANIZADA, cada um é cada um, sem abrir mão de nada. Será vascaíno ou rubro-negro, católico ou evangélico, doutor ou


egresso do ensino fundamental, de esquerda ou de direita, "duro" ou abastado, morador em barraco ou em mansão, simpático ao Governo ou seu crítico, usuário de ônibus ou passageiro de carro, viciado em carnaval ou amante de ópera, condicionado por sua idade, sexo, tipo físico, história pessoal, qualidades e defeitos. Nada disso separa; ao contrário, é fator de enriquecimento coletivo.


O que importa é, tão somente, a condição de cidadão, membro da COMUNIDADE ORGANIZADA. Não se requer que abra mão de nenhuma de suas convicções ou características, mas se exige em contrapartida que não procure impô-las a outrem. A COMUNIDADE ORGANIZADA é o palco do somatório, é o resultado do que cada um aporta. Uma única característica de um único cidadão/ã a menos, e o coletivo todo fica um pouco mais pobre. Quem quiser discutir política partidária, praticar o jogo da situação/oposição, sinta-se à vontade para fazê-lo onde cabe: no âmbito interno dos partidos e no espaço próprio do GOVERNO.


É perfeitamente possível para um cidadão ou cidadã ser militante em partido que integre a situação ou a oposição, e ser, simultaneamente, um comunitário atuante, capaz de posicionar-se no nível acima, que é o da busca do consenso. Não há brasileiro que desconheça haver tempo para vestir a camisa de seu time do coração, e tempo para vestir a camisa da seleção, onde convivem os maiores craques de cada time. Se assim não ocorrer, a COMUNIDADE ORGANIZADA estará permitindo que fissuras partidárias ajam, indevidamente, em seu seio. A convivência comunitária ficará impossível, e as instituições construídas com tanto esforço ruirão; a invasão do contraditório situação / oposição no lado da COMUNIDADE ORGANIZADA torna-a simples reprodução do GOVERNO, tornada selvagem pela ausência das normas que a balizam quando se expressa onde cabe. Não dá para incidir nesse erro crasso sem evoluir. Atribui-se ao Chanceler Konrad Adenauer o dito: "Se Deus limitou a inteligência humana, bem poderia ter limitado a burrice". Com todo o respeito, cabe a citação, quando se assiste à esterilização de uma entidade comunitária por aceitar a importação do vírus da situação / oposição. Foi assim com a Câmara de Entidades Petropolitanas, com o Fórum Popular, com o Conselho das Associações de Moradores, et coetera... Quando saberemos imitar o exemplo dos tão mal-falados lutadores de boxe, que são capazes de se esmurrarem reciprocamente, ao longo de quatro ou até dez assaltos mas, antes de deixarem o ringue, mudam de atitude e se cumprimentam? Quantas vezes vimos o vencido erguer a mão do vencedor, e pedir ao público palmas para quem o derrotou? Pombas, é lindo, mas quando vamos, no seio da Comunidade, copiar o admirável comportamento?


A COMUNIDADE ORGANIZADA é um maravilhoso universo composto pela miríade de formas de organização que a sociedade bola para unir os que têm preocupações ou objetivos semelhantes. São as associações de moradores, os sindicatos, as entidades de classe, as ONGs e OSCIPs em prol disso ou
daquilo, os diretórios estudantis, os clubes de serviço, os centros de convivência de idosos, os movimentos de cunho religioso, os partidos políticos (por sua vertente da busca do diálogo democrático), os grêmios e diretórios, as entidades de benemerência, e todas as mais entidades que possamos imaginar, submetidas à condição de serem reconhecidas como legítimas e atuantes pelo melhor dos juízes na matéria: o plenário da própria comunidade . A idéia é não excluir nenhuma, desde que aceite cumprir as duas normas únicas e que não admitem exceções: o respeito mútuo e a prova da legitimidade (no sentido de representar a entidade um segmento real e definido, e de manter sinais vitais perceptíveis, como a eleição regular de seus diretores). Voltemos para o lado de nosso gráfico que cabe ao GOVERNO, e ao nível do PREFEITO. Cabe ao PREFEITO logo após a sua eleição, com a participação de seu vice e dos partidos que constituem a sua base, organizar o seu SECRETARIADO. Caberá ao PREFEITO escolher o perfil de seus auxiliares imediatos, das pessoas de sua confiança a quem serão entregues fatias mais ou menos amplas da ação municipal. Os membros do SECRETARIADO são de livre nomeação e exoneração pelo prefeito; podem marcar as suas gestões com a sua personalidade, sua eficácia, suas preocupações de natureza ética, a sua visão comunitária mas, ao fim e ao cabo, devem afinar-se com a filosofia do prefeito. Se não concordarem com a mesma, pedirão as contas e o chapéu, ou aguardarão que o Prefeito adote a inevitável iniciativa. Fique a clara compreensão que o SECRETARIADO é, por definição, uma equipe submetida à uma vontade coordenadora central, a do PREFEITO. Funciona assim. Correspondendo ao plano do SECRETARIADO, do lado da COMUNIDADE ORGANIZADA, não costuma existir nenhuma ferramenta. E aí reside o desequilíbrio que costuma inviabilizar o sistema todo. É óbvio que não dá para equilibrar, de um lado, uma organização racional, com um coordenador único e colaboradores gabaritados em cada área, que podem recorrer a auxiliares e a um mínimo de recursos materiais, e de outro lado , um arquipélago disperso composto por ilhas independentes entre si... No espaço, os corpos celestes se atraem e se afastam, segundo forças e princípios definidos; na COMUNIDADE ORGANIZADA, costuma reinar a simpática anarquia.


Cada um por si e, paradoxalmente, o GOVERNO por todos. Acontece que, sob a ótica das entidades, o GOVERNO deve ser o interlocutor da COMUNIDADE ORGANIZADA, em pé de igualdade, e nunca, jamais, o tutor.


Só existe uma saída: a COMUNIDADE ORGANIZADA precisa ser capaz, por si mesma - resistindo à tentação de pedir ao GOVERNO que tome a iniciativa de guiá-la - de gerar uma instância que re-aprume as coisas. Insistimos: de um lado, temos uma organização (GOVERNO) coesa e hierarquizada, com áreas de ação bem distribuídas e apoiadas por ferramentas que podemos supor eficazes. Do outro lado, a multiplicidade de organizações nascidas do seio da população (COMUNIDADE ORGANIZADA) tende a anular-se entre si, pela falta de coesão ou, muito pior, por permitir que o contraditório situação/oposição invada a sua praia. Passamos a ter uma balança entortada do lado do prato do GOVERNO, embora os dois ramos tenham raiz comum. E, notem bem: a ninguém interessa tal desequilíbrio, nem ao GOVERNO que vê amputadas as suas esr


Se a COMUNIDADE ORGANIZADA não for capaz de gerar um instrumento tipo FÓRUM COMUNITÁRIO ou CÂMARA DE ENTIDADES, que corresponda ao SECRETARIADO característico do EXECUTIVO, e forme um Plenário com todas as organizações nascidas do tecido social, encontramo-nos em beco sem saída.


Como buscar os consensos possíveis, ou pelo menos a definição das preferências da maioria dos segmentos? Nem a organização desse Plenário é suficiente: é preciso que todos fiquem vigilantes para evitar a sua contaminação pelo contraditório entre situação e oposição. O que vem a ser um FÓRUM COMUNITÁRIO ou uma CÂMARA DE ENTIDADES? Trata-se de um espaço onde todas as entidades reconhecidas pela comunidade organizada como legítimas (podem até não ser legalizadas, como uma associação de moradores de bairro carente, por óbvias razões de economia, mas precisam ter a legitimidade de sua representação reconhecida pelo plenário) sentam-se em pé de igualdade, completamente à margem do governo e à margem do contraditório situação/oposição.


Não se trata de preparar qualquer tipo de confronto com o GOVERNO, que nunca deve existir. Trata-se de ativar a "assembléia geral" de que carecemos e sem a qual não haverá o equilíbrio que enseja a democracia participativa, não haverá continuidade, não haverá planejamento. No FÓRUM POPULAR ou na CÂMARA DE ENTIDADES elaboram-se propostas de políticas públicas, que iluminam o horizonte à frente bem além do término do mandato do PREFEITO/A em curso de mandato. Paira, portanto, acima do contraditório situação / oposição. A situação de hoje será a oposição de amanhã (ou até de depois de amanhã, mas o será, inapelavelmente), e vice-versa; ninguém pode assegurar a coerência que convém à POPULAÇÃO senão a COMUNIDADE ORGANIZADA através de seus mecanismos permanentes. Com a conveniente periodicidade, que dependerá do porte do município, do número de entidades, da pauta de temas, da organização local, e outras condicionantes, as questões de interesse comum serão inscritas em pauta para que se chegue a um consenso ou se apure uma nítida preferência. Se uma das duas opções não for viável, a questão deve ser deixada a critério das diversas entidades participantes, pois o propósito o fórum/câmara nunca será de engessar a livre manifestação das entidades, mas sim de permitir a ação coordenada lá onde verificar-se possível. Esse exercício de cidadania é possível e imprescindível, como evidenciam experiências acontecidas.


Na medida em que alcançarmos êxito na ativação de nosso FÓRUM ou CÂMARA, as vertentes GOVERNO e COMUNIDADE ORGANIZADA, nascidas no seio da mesma população, estarão em condições de igualdade para criar conselhos municipais temáticos eficientes, quer sejam paritários, quer adotem outra formatação. Pouco importará o seu caráter consultivo ou deliberativo; não se quer impor nada ao PREFEITO, e sim levar em dote, através do diálogo, a permanência que nenhum GOVERNO pode conquistar, dentro do sistema da alternância democrática, e os frutos dessa perenidade. A COMUNIDADE
ORGANIZADA tem os seus meios próprios de divulgação e defesa de suas propostas: a mídia, as entidades que a compõem, as sucessivas campanhas eleitorais (quando pedirá a cada candidato qual a sua posição em relação às políticas públicas desenvolvidas, e recomendará o voto naqueles que melhor as acolherem; não será essa a melhor definição de democracia bem exercida?). Sob o ângulo que aqui nos interessa, o da participação eficaz e eficiente, cada uma das duas vertentes, traduzida pelo SECRETARIADO, cá, e pelo FÓRUM ou CÂMARA, lá, vai gerar bancadas de conselheiros adequadas ao seu tipo de representação. A sua designação, e as formas de acompanhamento e monitoramento das representações nos Conselhos municipais, assegurarão equilíbrio e respeito mútuo nos diversos Conselhos temáticos, onde se dá a participação com particular intensidade e objetividade. Imaginemos um conselho paritário: X representantes do governo, trabalhando com outros tantos X representantes da comunidade, sobre determinado campo setorial. A representação do Governo é indicada por um SECRETARIADO, por definição coeso e bem coordenado. A representação da comunidade, caso não exista FÓRUM nem CÂMARA DE ENTIDADES, é deixada à maior ou menor iniciativa desta ou daquela entidade ou segmento, com forte marca de subjetividade, nenhuma delas tendo representatividade, além de seu segmento específico. Provavelmente, a entidade "A" votará azul, enquanto a "B" votará verde; nem terão conversado antes da reunião entre si, nem muito menos consultado o conjunto da COMUNIDADE ORGANIZADA. O GOVERNO não precisa mobilizar nenhum trator para que a sua metade do Conselho, votando unida, leve a melhor em qualquer debate. O PREFEITO e o seu SECRETARIADO definem qual a sua representação ideal nesse ou naquele conselho, assim como debatem as posições a serem defendidas e a maneira de encaminhá-las; faça pareco Se quisermos dispor de uma balança com os pratos equilibrados para praticar participação como manda o figurino, então não aceitemos que o diálogo se trave entre um lado "profissionalizado" e outro marcado pelo amadorismo menos pé-no-chão que se possa imaginar. O problema não é do GOVERNO, é da própria COMUNIDADE ORGANIZADA. As comunidades que anseiam pela participação devem fazer a sua parte de maneira soberana, pois somente assim estarão em condições de assumir o diálogo mutuamente respeitoso com o GOVERNO em situação de altiva igualdade e mútuo respeito, como convém à eficácia da participação. Algumas lideranças, representando organizações da COMUNIDADE ORGANIZADA, devem tomar a iniciativa de convidar as suas co-irmãs para uma primeira reunião. Os jornais, as rádios, as TVs locais são bons meios de mobilização, assim como a peregrinação às sedes das entidades, e a correspondência tradicional. Um auditório ou sala de reuniões, ou ainda uma sala de aulas, até a garagem ampla da residência de um companheiro, serão locais adequados para a busca da organização da caminhada. Deve-se deixar claro que não haverá exclusões: todas as organizações são bem-vindas. Que tragam o seu estatuto e as atas de suas últimas reuniões, em particular a que elegeu a atual diretoria. O carimbo do cartório é bem-vindo, mas não pode ser impeditivo; o que assegura a legitimidade de uma representação comunitária não pode ser o reconhecimento de um tabelião, mas sim o das instituições co-irmãs. Se o plenário dos iguais ratificar a legitimidade de uma organização comunitária, nada mais será necessário para assegurar-lhe assent Composto o plenário inicial de nosso FÓRUM ou CÂMARA, ficará sempre nossa "ágora" (a praça ateniense onde as pessoas discutiam questões de sua pólis) aberto à novas adesões, dependentes, exclusivamente, do reconhecimento da legitimidade da entidade pretendente e de seu desejo de participar, uma entre outras e todas iguais. Até bilhetes de banco já sabem; pluribus unum, um no seio de muitos. Quer vir participar? Pois seja bem-vindo, chegue-se ao pé da mesa, venha apresentar-se. Assista às primeiras reuniões, sem direito ainda a voto, enquanto os seus co-irmãos reúnem informações para aferir a sua legitimidade. Logo após o voto das mesmas, que deve levar em conta a vocação da neófita para a ampla participação e, também, o resguardo do Fórum contra os que poderiam desejar vir tumultuar o processo, a nova entidade passará a dispor de direito a voto. Simples, não? E a expressão de seu pensamento será garantida em toda a medida que não se tragam para dentro do Fórum ou da Câmara os argumentos pró-Governo ou antio As coordenadorias dos FÓRUNS ou CÂMARAS devem ter mandatos curtos, renováveis uma ou poucas vezes, para evitar hegemonias indesejáveis. Seis meses são um bom período para coordenar uma instituição tão essencial e abrangente; se os coordenadores forem, realmente, bons de bola, pois que mereçam mais um ou dois mandatos. Se não tiverem sido assim tão brilhantes, o plenário agradece sem traumas e parte em busca de outras soluções. O mandato curto também tem o grande mérito de não gerar apetites além do razoável; haverá outros caminhos mais gratificantes e menos trabalhosos para quem procura promover-se no seio da comunidade, visando a uma futura candidatura ao que quer que seja. Aproveitamos para deixar claro que não conhecemos melhor escola para futuros vereadores do que as lides comunitárias. Ao FÓRUM ou CÂMARA cabe o duplo papel de elaborar propostas de políticas públicas e de assegurar a retaguarda para as representações comunitárias nos Conselhos Municipais ou onde mais seja assegurado o diálogo entre COMUNIDADE ORGANIZADA e GOVERNO. A COMUNIDADE ORGANIZADA não pode abrir mão do direito de designar as suas representações sem interferência Governamental, se deseja preservar o indispensável equilíbrio. O conceito de paritário implica em equilíbrio, em igualdade de regras. Mais uma vez: as normas não devem objetivar o confronto, mas sim o diálogo entre partes complementares do mesmo todo, emanado do povo, como manda a Constituição. Já foi dito por pensador social-cristão, lá nos primórdios da evolução Industrial: "entre o forte e o fraco, é a Justiça que liberta e a Liberdade que oprime" (Lacordaire, acreditamos). Cabe ao EXECUTIVO designar quem deseja, para integrar a sua representação nos Conselhos Municipais, mas não lhe cabe (nem a ninguém mais) interferir na livre escolha das representaçõ Não basta designar conselheiros e seus suplentes. Há que se definir, coletivamente, as posições que devem defender, elaborar as propostas de políticas públicas que apresentarão, fornecer capacitação, monitorar a ação, avaliar desempenhos, corrigir rumos. Nenhuma entidade da COMUNIDADE ORGANIZADA, por si só, tem o direito de substituir-se à vontade coletiva. Em verdade, a ação independente de qualquer entidade corresponde à solapar a grande autoridade do conjunto da população. Lembrem: nenhum Secretário pode opor-se às orientações recebidas do PREFEITO; não buscará a COMUNIDADE ORGANIZADA semelhante unidade? Não podemos deixar de abordar, nestas reflexões, a questão especial dos planos diretores e dos orçamentos. O Estatuto das Cidades veda a sua votação pelas Câmaras Municipais antes que tenha ocorrido a participação popular. Causa espanto constatar que as COMUNIDADES ORGANIZADAS não cuidam de ocupar esse esplêndido espaço de atuação. Temos para nós que a responsabilidade maior pela falta de informação a respeito dos dispositivos legais (Estatuto das Cidades, Lei 10.257/01, LOM, Plano Diretor Municipal) incumbe aos partidos políticos, através de suas executivas ou diretórios municipais. As raríssimas exceções devem ser saudadas com tanto maior respeito, e alegra-nos verificar que ao nosso pequeno PHS cabe lugar de gente grande entre essas. Aos partidos cabe difundir o conhecimento e a prática das leis; infelizmente, raríssimos são os cidadãos de um determinado município que poderão citar o endereço de duas agremiações partidárias. Por serem estas, via de regra, absolutamente omissas. Que nos perdoem, mas ai Quando a COMUNIDADE ORGANIZADA posicionar-se contra o GOVERNO, além de tema definido relativo à política pública, será sintoma de contaminação pelo vírus do contraditório situação/oposição. O campo próprio da COMUNIDADE ORGANIZADA, a definição de políticas públicas, eixos permanentes de ação a médio e longo prazo, transcende o horizonte limitado de qualquer GOVERNO. Os CONSELHOS MUNICIPAIS, as AUDIÊNCIAS PÚBLICAS, os PLEBISCITOS e REFERENDOS, são formas diversas de diálogo mutuamente respeitoso entre GOVERNO e COMUNIDADE ORGANZADA, cada qual contribuindo com as suas características próprias. Esqueçamos as oportunidades de embates, preferindo-lhes o ensejo da construção duradoura. O EXECUTIVO pode propor, viabilizar, executar, com especial agilidade; a COMUNIDADE ORGANIZADA, e somente ela, pode assegurar a continuidade. O que lhe for impingido sem o seu acordo, ruirá logo ali na esquina. Em contrapartida, as políticas públicas sugeridas pela COMUNIDADE ORGANIZADA só se tornam realidade quando acolhidas pelo GOVERNO. É, assim, infinitamente tolo querer lutar contra essa evidência. juntos, GOVERNO e COMUNIDADE ORGANIZADA tudo podem; separados, enfraquecem-se, quando não se anulam. O diálogo entre a COMUNIDADE ORGANIZADA e o LEGISLATIVO precisa ser trabalhado com cuidado não menor do que aquele que se estabelece entre a COMUNIDADE ORGANIZADA e o EXECUTIVO. Há diferenças, nítidas algumas, sutis outras, mas que precisam ser levadas em conta. O LEGISLATIVO não é um monólito formado apenas pela situação, como o EXECUTIVO; pois é composto por situação e por oposição. A primeira costuma dominar, através de formação de maioria; mas há espaço legalmente assegurado para a oposição (minoria) e inúmeros instrumentos previstos para que esta possa se expressar, bem como a COMUNIDADE ORGANIZADA. A leitura do Regimento Interno da Câmara e da Lei Orgânica Municipal muito ensinará às lideranças comunitárias. Os dois maiores obstáculos que atravancam o diálogo que precisa ser estabelecido entre LEGISLATIVO e COMUNIDADE ORGANIZADA são, de um lado, a falência dos partidos políticos e, de outro lado, o corporativismo dos vereadores. Quem não ouviu, ainda, o argumento de ser a Câmara Municipal a legítima - e única - intérprete dos anseios comunitários, que me atire a primeira pedra. Essa visão distorcida faz honrosa companhia àquela que encontramos, com excessiva freqüência, no seio de EXECUTIVOS, e que leva a enfiar nas cabeças das lideranças comunitárias que procuram participar, a carapuça de integrantes da oposição. Até podem ser, mas se o forem, não são representantes da COMUNIDADE ORGANIZADA, mas militantes engajados em ações de cunho político-partidário. Erraram no tempo e no âmbito.


Comunitário fala de política pública, e sabe que o integrante do GOVERNO municipal de hoje é o seu companheiro comunitário de ontem e novamente de amanhã. A situação de hoje é a oposição de amanhã, e assim sem cessar, enquanto ae O LEGISLATIVO é a Casa do embate permanente entre situação e oposição. A COMUNIDADE ORGANIZADA é a casa da convivência entre situação e oposição. O EXECUTIVO é o momentâneo reduto da situação, amanhã oposição à nova situação. O menos arguto dos cidadãos que praticam a PARTICIPAÇÃO já constatou, com surpresa, que esta é muito menos atuante junto ao LEGISLATIVO do que junto ao EXECUTIVO. A tribuna livre e as audiências públicas são objeto de pouquíssima divulgação e menor interesse. Plenários vazios, dos dois lados do balcão de madeira que separa os vereadores da assistência, são a paga dos que acreditam nessas ferramentas tão preciosas. Quanto à Ouvidoria do Povo, avanço de nossa LOM, começou a virar zumbi quando do discurso de um Candidato ao cargo - o Dr. Domingos Bernardo da Silva e Sá - que se propôs a atuar de olhos postos no Executivo e também no Legislativo... Os vereadores se entreolharam e foi perceptível que as fichas caíram, tornando o instituto letra morta. Lamentável, mas assim se escreveu o episódio. A COMUNIDADE ORGANIZADA pode e deve corrigir esse estado de coisas. A receita do bolo é clara, embora talvez não seja tão fácil de execução. As leis estão aí, Constituição, Estatuto da Cidade, LOM, Plano Diretor Municipal; Executivo e Legislativo estão constituídos e plenamente operacionais, até os partidos cujas siglas estão representadas no Plenário do Legislativo são conhecidos e integram a comunidade. Claro, ainda falta a comunidade se conscientizar que ela precisa adotar organização que preencha o vazio que deixa desequilibrado todo o sistema. Por que deveria um LEGISLATIVO ter mais aguda visão social do que a população da qual deriva? Se a participação não construiu o seu espaço próprio, não reforçou a COMUNIDADE ORGANIZADA, seria acreditar em Papai Noel desejar que uma Câmara Municipal tomasse a iniciativa de estimular o que vê - erradamente - como uma forma de concorrência. Parece-nos evidente que, na exata medida em que o FÓRUM POPULAR - ou a CÂMARA DE ENTIDADES - mobilizar a SOCIEDADE ORGANIZADA, e conseguir carrear dezenas de lideranças para compor a assistência aos eventos participativos, informando as diversas formas de mídia e mantendo o MP informado sobre eventuais desvios, além de conseguir o ativo respaldo do máximo possível de partidos políticos, a perspectiva pela qual é visto o diálogo COMUNIDADE ORGANIZADA / LEGISLATIVO mudará na hora. Ou a COMUNIDADE ORGANIZADA reconhece que precisa estruturar-se por sua própria iniciativa, age nesse sentido, e faz as coisas acontecerem da maneira certa, ou vamos ficar chorando sobre o leite derramado até o final dos tempos. Não carecemos de leis novas, as que existem são mais do que suficientes para que o sistema funcione a contento, sem confrontos que ninguém deseja (e que não levam a lugar nenhum). Nada, nada mesmo, nem conselhos municipais temáticos, nem audiências públicas, nem tribunas livres, nem plebiscitos e referendos, nem ouvidorias, resultarão em algo positivo para a POPULAÇÃO se a COMUNIDADE ORGANIZADA não carregar a sua parte do andor. Olhemos os plebiscitos e referendos. Tal como figuram na Constituição, não têm validade prática no âmbito municipal, pois é inviável mobilizar-se a máquina eleitoral para questões locais (basta ver o esforço a que obriga a limitada votação para o Conselho Tutelar). Mas há formas e formas de plebiscitos e de referendos. Permitam que cite um exemplo vivido: o processo de Orçamento Participativo de 2.003, que envolveu 10% da população de nosso Município. Os erros e acertos dessa experiência vivida, adequadamente registrados, podem ser aproveitados para que se montem ações de consulta popular, econômicas e auto-disciplinadas, usando a extensa rede de entidades que compõem a COMUNIDADE ORGANIZADA. Acreditamos que poucos cidadãos e cidadãs tenham uma idéia do número de organizações que a sociedade criou, em qualquer canto para onde se olhe. Esse tecido social é a mais extraordinária das forças políticas, só precisa dispor de um mínimo de auto-coordenação. Podem-se efetuar inúmeras consultas à população, recorreo. Sempre haverá quem tema a luz e se oporá à proposta de harmoniosa integração entre os Poderes constituídos e a COMUNIDADE ORGANIZADA.


Se a alguém incomoda que: a) se definam políticas públicas de médio e longo prazo, b) que as Leis existentes sejam implesmente cumpridas, c) que a PARTICIPAÇÃO ocorra, d) que situação e oposição tenham consciência dos diversos planos e dos modos de relacionamento diverso que situação / oposição devem adotar em cada caso, bem, nesse caso, claro que tentará tratorar propostas como as que aqui são feitas.


É prática democrática que todas as idéias sejam expressas, ouvidas e debatidas. As que defendemos seguem acima, com suas razões e seus caminhos. Aqui paramos, e ficamos ao dispor de quem desejar conversar ou debater, concordar ou discordar. Pois sabemos que o que mata a vida comunitária não é a reflexão sobre pontos de vista diversos. Os vírus fatais chamam-se sectarismo e indiferença. Os sintomas das duas viroses são diversos mas ambas podem conduzir a desfecho fatal. Bom proveito ao eventual leitor (não custa ser otimista), e tomara que tenhamos ajudado a avançar meio milímetro, nessa maravilhosa caminhada da POPULAÇÃO em busca da eficiência coletiva, através do harmonioso diálogo municipal entre EXECUTIVO, LEGISLATIVO e COMUNIDADE ORGANIZADA.

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